A alternativa existe Versão para impressão
Sexta, 25 Março 2011

Passos Coelho disse que o teatro tinha acabado ao referir-se à sua decisão de não aprovar o PEC IV, o que levaria à queda do governo. Esqueceu-se de dizer que a sua “fala” veio na sequência da “deixa” de Sócrates que, ao apresentar o PEC IV a Merkel sem passar cartão ao Parlamento, ao Presidente da República e ao PSD, seu aliado de governação “austeritária”, conduziu a trama ao desenlace que lhe é mais favorável: eleições antecipadas, evitando ficar mais tempo a fritar em lume brando, com o povo na rua a protestar (a Greve Geral seria o culminar das grandes manifestações de protesto  popular de 12 e 19 de Março) e o PSD com um pé no governo e outro na oposição à espera que o poder lhe caísse nos braços, de podre.

O 12 de Março de 2011 já é uma data histórica. Nunca os portugueses tinham saído à rua em tão grande número, desde o 25 de Abril de 1974. Há 37 anos! Não admira que tanta gente tenha extravasado de emoção, com lágrimas nos olhos, como eu vi nas reportagens televisivas, em Lisboa, no Porto e, ao vivo, no Rossio de Viseu.

Esta foi a mais expressiva moção de censura ao governo de José Sócrates. Mas, surpreendentemente, para alguns, uma boa parte dos manifestantes não se insurgia apenas contra o governo do PS, mas também contra o PSD que tem apoiado a austeridade imposta brutalmente aos portugueses com o Orçamento de Estado, e com os PEC I, II e III. E bem pode Passos Coelho vir agora dizer que “o teatro acabou” e que não apoia o PEC IV, porque a verdade é que ainda está bem fresca na memória dos portugueses a sua afirmação de que estaria disponível para governar com o FMI. Ora, o PEC IV não é mais do que a receita do FMI antecipada por Sócrates, a mando de Merkel, a quem, de resto, Passos Coelho também já vai pressurosamente dar explicações, não fosse a Frau Europa pensar que ele não daria um primeiro ministro tão lacaio quanto o actual.

Em Viseu, entre os inúmeros cartazes empunhados pelos jovens manifestantes, alguns eram sintomáticos do espírito crítico de grande parte dos portugueses, face aos dois partidos que, há quase 37 anos, têm, alternadamente, desgovernado Portugal, governando-se a si e às suas ilustres (mas nem por isso distintas) clientelas. Um destes cartazes ostentava duas máscaras, uma cor de rosa e outra laranja, com uma mão sobreposta a mostrar um cartão vermelho. Uma variante desta mensagem surgia noutro cartaz, de forma mais explícita, com as mesmas máscaras e a eloquente legenda: “Basta PS com ou sem D”.

A solidariedade e a indignação de muitos pais e avós veio juntar-se à criatividade e alegria dos jovens que encheram o Rossio, ou seja, todas as gerações à rasca deste país, a manifestarem a sua revolta, através do microfone aberto que os organizadores colocaram à livre disposição de todos os presentes.

Muitos dos jovens que estiveram nas manifestações do 12 de Março também participaram no Dia de Indignação e Protesto do passado sábado, convocado pela CGTP, e hão-de encher as praças e avenidas deste país no 25 de Abril e no 1º de Maio. Porque o combate ao desemprego, à precariedade laboral e às  desigualdades sociais, passa pela articulação de lutas nacionais com as lutas dos outros povos da Europa, podendo chegar, inclusivamente, à convocação de uma greve geral europeia.

Até lá, resta aos portugueses desempregados ou com reformas de miséria aproveitarem o Sol e o recuo do governo ao baixar o IVA do aluguer dos campos de golfe de 23% para 6%, mandando umas vigorosas tacadas para os incontáveis buracos dos verdes campos deste país “à rasca”.

Passos Coelho, nem esperou que Sócrates se levantasse do trono, para tirar a máscara e mostrar um outro sócrates, mais vazio de ideias e ainda mais neoliberal. Eis o seu programa: governar com o PS, mas sem Sócrates (para diluir responsabilidades pela austeridade passada e futura); aumento do IVA (diz que é a alternativa aos cortes das pensões mais baixas, como se os mais pobres não fossem penalizados ao pagar mais cara a comida, os transportes, o gás e a electricidade); privatização dos hospitais públicos (meio caminho andado para liquidar o Serviço Nacional de Saúde); privatização da gestão das universidades públicas e criação do “cheque ensino” (meio caminho andado para liquidar a escola pública); facilitar despedimentos, contratos de trabalho verbais e redução do pagamento do trabalho aos fins-de-semana (o que irá originar mais desemprego e mais exploração de quem trabalha); redução do número de deputados (medida populista e demagógica que apenas visa reduzir a proporcionalidade, de forma a que os pequenos partidos fiquem com menos deputados. De resto, os 4 milhões que se poupariam com a redução de deputados poderiam ser até ultrapassados se reduzissem antes as subvenções aos partidos).

Portugal tem de deixar de ser uma “casa de alterne”, com um incompetente (como até Carrilho chamou a Sócrates) a alternar no papel de primeiro-ministro com outro incompetente. E a alternativa à alternância que em 35 anos levou o país a este estado, não pode ser a farsa de um “bloco central” de incompetentes, mas antes um governo verdadeiramente socialista e de esquerda que aplique medidas como as que o PCP e o Bloco de Esquerda apresentaram em alternativa ao PEC IV (o BE propôs mais justiça fiscal e um corte de 229 milhões nas Parcerias Público-Privadas para poder aumentar 180 milhões nas pensões mais baixas, o que daria mais 10 euros a cada reformado e ainda sobrava dinheiro).

O “teatro” ainda não acabou, mas chegou a hora de o público subir ao palco e expulsar de cena os maus actores.

Carlos Vieira e Castro

 

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