COPA DO MUNDO PARA QUEM? Versão para impressão
Quarta, 14 Março 2012

logo-campeonato-do-mundo-futebol-brasil-20141Em uma terça-feira, dia 30 de Outubro de 2010, de Zurique na Suíça o Comitê Executivo da FIFA anunciou que o Brasil será sede oficial da Copa do Mundo 2014. A notícia chegou trazendo muita alegria ao “país do futebol”, enaltecendo em muitos o orgulho brasileiro de sediar o maior evento internacional de celebração desse esporte, prova de que o “Brasil é o país do futuro” e agora poderá finalmente mostrar a sua cara ao mundo. Mas qual cara se quer mostrar?

Artigo de Isabella Miranda e Fábio Merladet

 

Em todas as cidades sede dos jogos a iniciação dos preparativos para o grande Mundial já revelam uma série de contradições entre a cidade existente e a cidade que ser quer que o mundo veja.

Lideradas por grandes empresários e por políticos aliados aos seus interesses, alinhada as exigências da FIFA e excludente nos termos de participação democrática da população, as operações urbanas em decorrência da Copa revelam a tentativa de se reproduzir um modelo hegemônico de cidade: limpa, moderna, desenvolvida, eficiente e sem pobreza, um modelo de cidade espetáculo.

Mega-eventos e mega-projetos urbanísticos têm gerado mega-violações de direitos e mega-desigualdades em Pequim, em Nova Delhi e na África do Sul onde, por causa da Copa do Mundo, os negros mais pobres foram removidos do centro de Cape Town para “Blikkiesdorp”, uma favela de conteiners de latão com nome de campo de concentração nazista a mais de 30 quilometros da cidade. A Copa do Mundo no Brasil parece ir pelo mesmo caminho ao criar uma cidade de exceção em que a cidadania e os direitos constitucionais são suspensos e são enormemente ampliadas as desigualdades sociais e espaciais em favor do capital financeiro, mercantil e imobiliário.

O Comitê Olímpico, a ISL Marketing e a FIFA (Federação Internacional de Futebol Associado), que desde 1904 estipula o jeito “certo” de jogar, organizam e definem de acordo com os seus padrões de rentabilidade, os detalhes dos Mundiais, desde os estádios até as cidades. Sob seus critérios o futebol vai se transformando, cada dia mais, em uma indústria inimiga da alegria e do prazer de jogar.

O Projeto de Lei Geral da Copa que se quer implementar no país por pressão da FIFA, além de outras condições absurdas impostas por esta organização, demonstram um caráter de intervenção autoritária na legislação brasileira em prejuízo dos direitos constitucionais e da soberania popular e em favor da volúpia lucrativa da FIFA e de suas empresas parceiras.

O Projeto de Lei Geral da Copa, se aprovado, irá instituir disposições que dão à FIFA e aos investidores condições de exclusividade econômica, disponibilização de serviços públicos, e atenção especial à proteção de propriedades industriais como marcas e logos da FIFA e multinacionais parceiras e punição severa de falsificadores; a exclusividade nos direitos de imagem, sons, radiodifusão e acesso aos Locais Oficiais de Competição; proibição de manifestações em locais de visibilidade que possa prejudicar o evento, com a violação dos direitos a liberdade de expressão; monopólio de comercialização dos ingressos e desrespeito às legislações que definem meia entrada para idosos e estudantes, entre outros. Além desse projeto, já estão em curso nos níveis municipais medidas como a flexibilização da Lei de Licitações para grandes obras de infra-estrutura, a violação de legislações ambientais, o desrespeito aos mapas de planejamento urbano e de zoneamento do solo e a negação da participação da população no planejamento das cidades.

Além desse aterrador cenário que parece suspender disposições constitucionais básicas, é preciso ressaltar que os ônus advindos da realização dos jogos no Brasil incidirão quase que inteiramente sobre o dinheiro do povo. Já foi anunciada pelo Governo Federal uma estimativa de 23 bilhões em gastos para a Copa, dos quais 98% devem vir dos cofres públicos. Estados e municípios que não tem nada a ver com o Mundial, ficaram fora da bolada, assim como investimentos nas áreas prioritárias como a saúde, a educação e a proteção social do governo já estão a ser cortados. Acresce-se a isso o risco do país não conseguir recuperar o dinheiro investido e acabar ficando com dívidas, assim como aquelas levantadas pela África do Sul, no Mundial de 2010, a Grécia, nas Olimpíadas de 2004 e o Rio de Janeiro, com os jogos Pan Americanos. Outras medidas como a privatização de aeroportos e estádios de futebol, também parecem indicar que a população tem muito a perder com o Mundial.

Mais preocupante, porém, é que a realização dos jogos está gerando contextos em que são violados sistematicamente direitos humanos básicos[1]. Isso é o que denunciam os movimentos sociais, órgãos públicos de defesa dos cidadãos e a Relatora Especial das Nações Unidades para Moradia Adequada, Raquel Rolník.

Moradores de favelas, população de rua, prostitutas, e outros trabalhadores informais já começam a sentir os efeitos negativos das operações urbanas e do avanço da especulação imobiliária nas regiões centrais e próximas aos estádios. Milhares de famílias estão sendo forçadamente removidas das áreas onde vivem para a construção de infra-estrutura para os eventos, moradores de rua estão sendo assassinados pela polícia, e muitos trabalhadores informais perderam a possibilidade de trabalhar quer diante da intensificação da fiscalização dos municípios, quer pelo avanço do grande mercado capitalista nas zonas onde trabalhavam. Para essas pessoas a Copa do Mundo provavelmente não será a grande festa do futebol, mas o pesadelo de serem removidas dos espaços urbanos em que durante anos moraram e trabalharam.

Diante disso, vários setores da sociedade começam a se organizar para lutar contra os efeitos perversos do avanço de políticas privatizantes e violadoras de direitos levadas a cabo em conformidade com interesse do capital e de organizações nada democráticas ou confiáveis como é o caso da FIFA. Foram criados Comitês dos Atingidos pela Copa[2] em todas as cidades sede, que têm por objetivo uma articulação local, nacional e global com a finalidade de unir forças, denunciar violações, organizar assembléias e manifestações de forma a minimizar os efeitos negativos da Copa do Mundo sobre a população.

 

[1] Para mais informações ver Dossiê Nacional “Megaeventos e Violações de Direitos Humanos (também disponível em inglês: http://www.portalpopulardacopa.org.br/index.php?option=com_k2&view=item&id=198:dossi%C3%AA-nacional-de-viola%C3%A7%C3%B5es-de-direitos-humanos

[1] Para mais informações sobre os Comitês dos Atingidos pela Copa: http://www.portalpopulardacopa.org.br/

 

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