Pinheirinho: Justiça de classe e omissão do poder público Versão para impressão
Segunda, 06 Fevereiro 2012

 

pinheirinho PM

A reintegração de posse ocorrida no Pinheirinho, em São José dos Campos, no interior do estado de São Paulo, com extrema violência policial, resultou em milhares de desabrigados; centenas de feridos por bombas, balas, cassetetes e gases tóxicos; e possíveis desaparecidos, vítimas de um aparato policial descomunal que comprovou mais uma vez que, no Brasil, a questão social continua sendo tratada como caso de polícia. Foi uma operação injustificável, ilegítima, contra mulheres, crianças, idosos, trabalhadores, estudantes que perderam sua moradia e tudo o que tinham, sem que absolutamente nada lhes fosse ofertado.

 

Como testemunha direta do ocorrido e participante das negociações que tentaram evitar tamanha tragédia, temos a obrigação de relatar a insensatez das decisões das autoridades responsáveis pelo espetáculo da truculência, da violação dos direitos humanos e do desprezo pelos “de baixo”. Não foi por falta de argumentos, indicando inúmeras possibilidades para as autoridades do Judiciário e os governantes do município, estado e União, que o episódio Pinheirinho teve este desfecho. Foi pela intransigência da Justiça e pela omissão dos governos.

Acompanhamos de perto a situação do Pinheirinho. Estivemos várias vezes com a população antes da operação. Testemunhamos o despacho do Tribunal de Justiça, que havia dado um prazo de 15 dias para que os governos negociassem e encontrassem uma solução para os moradores. Mas, na manhã do domingo, dia 22 de janeiro, fomos surpreendidos com a notícia de que a Polícia Militar, sob o aval do Tribunal de Justiça, havia iniciado a operação de desocupação. Mais de seis mil moradores estavam cercados por dois mil policiais.

Já em São José dos Campos, no centro de comando da operação militar, tentamos negociar. Não adiantou. Todos ali – Justiça, Polícia Militar, governo estadual e municipal – estavam de acordo. O governador Alckmin havia elogiado a operação. O Tribunal de Justiça também parabenizava a ação.

Recorremos ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), pedindo um posicionamento sobre o impasse gerado pelas diferentes decisões da Justiça, na esfera estadual e federal. Na véspera, a Justiça Federal também havia suspendido a reintegração de posse, reforçando o prazo para a negociação. Apesar disso, absurdamente, o Tribunal de Justiça manteve a ordem de desocupação antes da definição da instância superior. Ao final, quando as casas dos moradores do Pinheirinho já eram atingidas pelos tratores, o STJ também se colocou a favor da reintegração, revelando o caráter classista da Justiça brasileira, que tem lado neste país: o dos ricos.

Predominou o interesse da valorização e especulação imobiliária do terreno de 1,3 milhão de m2 do Pinheirinho. Terreno este que pertence à massa falida da Selecta, empresa do megaespeculador financeiro Naji Nahas, acusado de quebrar a bolsa do Rio de Janeiro no final dos anos 80 e detido pela Polícia Federal em 2008, por crime financeiro, desvio de verbas públicas, corrupção e lavagem de dinheiro.

 

Para além disso, a ação da polícia na desocupação do Pinheirinho também teve um caráter exemplar e laboratorial do ponto de vista militar, para conter ações de resistência popular, com um aparato impactante, acompanhado de planejamento, informação e eficácia de repressão. Foi uma operação exemplar para criminalizar movimentos sociais legítimos e intimidar futuras mobilizações visando a conquista de direitos.

 

O governo estadual, que tinha enorme espaço para usar a inteligência e recursos antes da força, preferiu colocar, assim como a Justiça, a propriedade privada acima da vida e a violência policial contra o direito cidadão à moradia. O prefeito de São José dos Campos, que tinha a obrigação de acolher os moradores e responder pelo seu bem estar, preferiu acionar a truculência da Guarda Municipal e serviu à desocupação. O governo federal também foi omisso. Diante da iminência do conflito, deveria ter agido rapidamente para evitar a desocupação, acionando ele próprio a Justiça Federal ou desapropriando a área ocupada. Mas nada foi feito.

Neste momento, para além de dar uma resposta imediata à crise humanitária instalada em São José, com as famílias abandonadas em locais improvisados, é preciso combater este modelo de ocupação das cidades brasileiras, que favorece os poderosos e trata seres humanos como descartáveis. E é preciso que as autoridades responsáveis pela ação no Pinheirinho sejam responsabilizadas, dentro e fora do Brasil. Nós não nos calaremos. Somos todos Pinheirinho!

Ivan Valente, deputado federal e presidente nacional do PSOL – Partido Socialismo e Liberdade

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