Um mês com 580 dias - Editorial A Comuna nr. 31 Versão para impressão
Quinta, 01 Maio 2014

A COMUNA 31Um povo que vê raiar a madrugada depois de 48 anos de noite e crimes é um povo com esperança e cuja consciência muda e se eleva, que vê brotar da força material da mudança as possibilidades de uma consciência transformadora.

 

Editorial de Bruno Góis

 

1. Há 40 anos, o povo português sentiu do seu lado a força da juventude e das armas com o golpe dos capitães que derrubaram o regime fascista de Salazar e de Caetano. O regime não caiu da cadeira, foi preciso mesmo aquela força que invadiu o Terreiro do Paço e o Largo do Carmo. Rapidamente se veria que o golpe era curto, e que o povo não permaneceria em casa. As ruas eram suas.

Um povo que vê raiar a madrugada depois de 48 anos de noite e crimes é um povo com esperança e cuja consciência muda e se eleva, que vê brotar da força material da mudança as possibilidades de uma consciência transformadora. Nunca se leu tanto neste país. Um povo aprisionado na ignorância e na miséria pelo o fascismo e o capitalismo aprendeu muitas palavras novas novas para construir o futuro. A intensidade das lutas sociais e do sonho fazem muitas e muitos julgar que os dias tinham pelo menos 25 horas e continuavam curtos, neste mês de Abril que durou 580 dias.

Isolado internacionalmente, enfraquecido politicamente por hesitações reformistas e inexperiências revolucionárias, traído pela espingarda que se virou no 25 de Novembro, este longo Abril é um futuro interrompido. A análise marxista deste processo não o deve encarar com o fatalismo com que a direita e o reformismo condenam, à partida, a revolução portuguesa como votada ao fracasso. O passado não se muda, mas aquele fim de Abril não estava escrito nas estrelas, ainda que nas agendas imperialistas. Todas as forças externas e internas que se mobilizaram contra o PREC sabiam que esta podia ser a primeira de uma série de revoluções na Europa Ocidental. O cabresto das transições ainda não estava seguro aqui ao lado no Estado Espanhol e os trabalhadores e os povos, muito além da península, poderiam também despertar para sonhar com as mãos o socialismo e a liberdade.

2. "O movimento operário e popular entrara em cena no grandioso 1º de Maio de 74 e tomava consciência da sua força", eis um dos 580 dias que mudaram Portugal (Alberto Matos). Um Abril que "foi também um filho da luta dos povos das colónias pela liberdade" (Mário Tomé). Um Abril que permitiu às mulheres portuguesas comemorar o 8 de Março em 75 mas onde elas e algumas das suas lutas foram invisibilizadas "embora as mulheres tenham sido protagonistas na rua desde as primeiras horas" (Almerinda Bento). Um Abril que não pode ser explicado simplesmente com os iniciais 3D do Movimento das Forças Armadas, pois "sem o S de socialismo não se entenderiam as paixões e a acesa luta de classes de 74/75 e as referências culturais que transformaram mentalidades antes, durante e depois da revolução dos cravos" (Luís Fazenda).

A Comuna publica neste 1º Maio um número Especial sobre os 40 Anos do 25 de Abril. Neste número são recuperados os contributos de Luís Fazenda, Alberto Matos e Mário Tomé no número dos "20 Anos de Abril" da revista Perspectiva, artigos que persistem tão frescos quanto a perspetiva revolucionária!

O número 31 conta ainda com o artigo "Porque lutam as mulheres?" (Almerinda Bento) e com os testemunhos escritos, 40 anos depois, por Alberto Matos, Almerinda Bento, Carlos Vieira e Castro, Cipriano Pisco, Esmeralda Mateus, Fátima Barata, Fernando Figueira, Francisco Alves, Joaquim Espírito Santo, Luís Filipe Pereira e Noémia Nunes.

3. A nova geração de revolucionárias e revolucionários precisa de aprender com estas histórias. A cantiga e a memória são armas. E urge também encarar o presente. 40 anos depois de Abril, o país é alvo da terceira intervenção do FMI e da política de empobrecimento pactuada entre o PS/PSD/CDS e a Comissão Europeia. Estamos numa nova vaga de saque à propriedade pública e aos direitos sociais e liberdades que o PREC fez escrever na Constituição. Nenhuma lei resiste sem força social. E como bem sublinhou o deputado da UDP na Constituinte, embora a Constituição sirva de barreira contra as forças reaccionárias, "é a luta do povo e só ela que é decisiva".

A consciência popular regrediu, embora nos anos recentes tenha havido momentos de esperança nas mobilizações populares que foram da "geração à rasca" ao "que se lixe a troika", passando por todas as lutas sindicais e de outros movimentos sociais. Com todas as barreiras presentes, o avanço tecnológico, da instrução e heterogeneidade da classe trabalhadora e de toda a vida social colocam novos desafios e novas perspetivas para o salto da transformação social.

A geração que não viveu Abril só pode ter saudades da próxima revolução.

Bruno Góis, diretor da revista A Comuna

Editorial d'A Comuna nr. 31 (Maio 2014)

 

 

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