Mulheres invisíveis Versão para impressão
Sexta, 07 Março 2014

i-love-feminism1Neste sistema capitalista, há uma apropriação do trabalho de modo a produzir lucro e mais-valia através da exploração e controle da mão-de-obra da classe trabalhadora. Neste sentido, o "sistema capitalista e patriarcal não considera o trabalho exercido no campo da reprodução humana, ou seja, o trabalho doméstico, informal, exercido maioritariamente pelas mulheres".

Artigo de Ana Paula Canotilho

Com a entrada, cada vez maior, das mulheres no mercado de trabalho, para além de haver uma maior visibilidade, apresentam um conjunto de novas experiências vividas nos locais de trabalho e num contexto mais amplo da própria sociedade. "A visibilidade da experiência se torna então evidência para o facto da diferença, em vez de se tornar uma forma de explorar como a diferença é estabelecida, como ela opera, e como de que maneira constitui sujeitos que veem e atuam no mundo (Haraway,1998:583)," ou seja, a experiência, alcançada tanto pela visibilidade "quanto por outro modo que tome o significado como transparente" (idem), reproduz sistemas ideológicos, como convenções sociais. O trabalho está, intimamente, relacionado a auferir um determinado salário, vindo do processo de industrialização e adotado pelo sistema capitalista "que organizou o trabalho para atender aos interesses econômicos da burguesia, e ao patriarcado que coloca os homens no campo da produção econômica e as mulheres no campo da reprodução social" (Barbosa,2011:2).

Neste sistema capitalista, há uma apropriação do trabalho de modo a produzir lucro e mais-valia através da exploração e controle da mão-de-obra da classe trabalhadora. Neste sentido, o "sistema capitalista e patriarcal não considera o trabalho exercido no campo da reprodução humana, ou seja, o trabalho doméstico, informal, exercido maioritariamente pelas mulheres" (idem:3)

Considerada uma profissão socialmente desvalorizada e invisível aos olhos da lei, em muitos dos países é quase como não ter profissão, caso das empregadas domésticas a dias, que trabalham em casa dos/as outros/as sem critérios mínimos de proteção. Estas mulheres conseguem, por vezes, um contrato de trabalho, mas na maioria dos casos esse contrato não é feito, trabalhando na base da confiança. Não descontam para a Segurança Social, não têm direito a subsídio de doença e, quando perdem o emprego, não têm direito a nada. Quando estas mulheres têm contrato de trabalho, é-lhes pago o subsídio de férias e natal, descontam o mínimo para a Segurança Social, têm direito a subsídio de doença, mas não têm direito a subsídio de desemprego. O trabalho doméstico não é considerado um trabalho, não são consideradas trabalhadoras e, por conseguinte, não estão cobertas pela legislação laboral, nem sequer têm proteção social. Esta é uma atividade desempenhada maioritariamente por mulheres que tradicionalmente sempre desempenharam as tarefas da limpeza e do cuidar.

Em todas as sociedades as mulheres trabalharam em casa desenvolvendo as tarefas familiares, tarefas minuciosas e repetitivas, "as mulheres trabalhavam nas casas grandes exercendo diversas tarefas: limpar, cozinhar, lavar e o cuidado com as crianças e os doentes. Durante séculos essas tarefas foram atribuídas unicamente às mulheres, como atividades naturais do sexo feminino, portanto, as mesmas deveriam ser realizadas com destreza, amor e benevolência" (idem).

Com a industrialização as mulheres inserem-se no mundo do trabalho produtivo e assalariado e, ao saírem da esfera do privado para a esfera do público, há uma desvalorização desse trabalho, mantendo a exploração doméstica onde exercem a dupla jornada de trabalho, uma dupla opressão de classe e de género.

Considerada uma profissão isenta de riscos profissionais que não requere competências especificas, pouco qualificado, informal, não declarado e também não registado.

Essas características reforçam a inviabilidade e desvalorizam o trabalho doméstico, por ser exercido predominantemente pelas mulheres. Ferreira (2005) refere que: "a vulnerabilidade e a precariedade são características do trabalho das mulheres no capitalismo e antes dele, assim como a desvalorização do trabalho reprodutivo e, neste âmbito, a "invisiblidade" do trabalho doméstico, realizado pelas mulheres, seja nas zonas urbanas ou rurais. (FERREIRA, 2005, p. 34).

Existem dificuldades em apurar o número de mulheres que trabalham nesta atividade, não só em Portugal como em todo mundo. No entanto, sabe-se que nos países em desenvolvimento representa quatro a dez por cento do emprego total e nos países desenvolvidos entre um e dois e meio por cento. Percebemos que o trabalho exercido por estas mulheres é essencial, é ele que permite a outras mulheres saírem de casa e ocuparem postos no mercado de trabalho. Não têm, muitas das vezes, como pagar a outra pessoa para as substituir, garantido que, este trabalho reprodutor seja realizado, mas uma grande parte dos patrões não cumpre a  legislação.

No brasil,  uma investigação refere que existem 6,6 milhões de trabalhadoras domésticas, sendo 92,6% mulheres.  A OIT (Organização Internacional do Trabalho) considera o Brasil o maior mercado de mão de obra doméstica do planeta, com 7,2 milhões de profissionais formais e informais.

"Empregadas domésticas, faxineiras, cozinheiras, babás, jardineiros e outros empregados que trabalham em domicílios passam a ter a jornada máxima de trabalho estabelecida em oito horas diárias e 44 horas semanais. No caso de o serviço se prolongar para além desse período, eles também passam a ter direito ao recebimento de horas extras de 50% a mais que o valor da hora normal e adicional noturno de 20%, no caso de o trabalho ocorrer após as 22h. Outros direitos que passam a valer é o recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e indenização em caso de demissão sem justa causa[1]".

Em Portugal mais de 7,2% das mulheres são empregadas domésticas remuneradas, estando no terceiro lugar dos 26 países desenvolvidos com maior percentagem destas trabalhadoras, refere a OIT. Caracteriza-se pela precariedade, pela ausência de contrato de trabalho, pelo atraso no pagamento dos salários, pela exigência de realização de horas extraordinárias sem a devida remuneração, pelo desrespeito pelo direito às folgas e descansos, pelo não pagamento de feriados e férias, pela ausência de pagamentos à Segurança Social, entre outros. Segundo a OIT, em muitos casos, as trabalhadoras domésticas são vítimas de baixos salários, horários excessivamente longos, ausência de um dia de descanso semanal e, às vezes, abusos físicos, psicológicos e sexuais, ou restrições à sua liberdade de movimentos. Portugal tem uma lei específica para trabalhadoras domésticas, que contém aspetos discriminatórios como estes : um/a trabalhador/a que exerce a atividade em regime de contrato de trabalho mensal a tempo completo tem direito ao subsídio desemprego. Nos primeiros cinco anos de trabalho, o/a trabalhador/a apenas tem direito a 50 por cento do subsídio de Natal (artigo 12.º). O contrato de serviço doméstico pode ainda caducar por «insuficiência económica do empregador» (artigo 28.º) o que, na atual conjuntura social de cortes salariais e aumento de impostos, devido às políticas implementadas pelo governo PSD/CDS e Troika, coloca estas trabalhadoras em situação extremamente precarizada e desprotegidas.  Neste sentido é urgente valorizar  e dignificar o trabalho doméstico.

 

Bibliografia

Barbosa ,Luciana Cândido, 2011 Desvalorização e invisibilidade do trabalho domestico: Reflexões iniciais. III seminário Nacional género e praticas culturais olhares diversos sobre a diferença 26,27,28 de outubro de 2011 João Pessoa PB

Organização Internacional do Trabalho,2013 http://www.ilo.org/public/portugue/region/eurpro/lisbon/html/portugal_12_junho_13_pt.htm Lisboa

Ministério do Emprego e da Segurança Social Decreto-Lei n.º 235/92 de 24 de Outubro http://www.igf.min-financas.pt/Leggeraldocs/DL_235_92.htm

Guia Prático Inscrição, Alteração e Cessação de Serviço Domestico Instituto da segurança Social,  2013 IP. http://www4.seg-social.pt/documents/10152/14967/inscricao_admissao_cessacao_sd

[1]  Ver em http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2013-03-20/domesticas-comparam-aprovacao-de-lei-no-congresso-ao-fim-da-escravidao.html

 

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