A Papisa Joana Versão para impressão
Sexta, 15 Março 2013

papisa joanaA lenda da Papisa Joana é, das histórias que cercam o Vaticano, uma das que mais intriga historiadores e crentes. Há quem defenda que apenas se trata de uma lenda e há quem ateste que se trata da mais pura verdade.

O problema e argumento principal para quem defende que é uma lenda é a falta de registos sobre a Papisa em documentos da época. No entanto, os defensores de que se trata de uma história verdadeira consideram que o poder da Igreja naquela altura explica a falta de registos sobre a Papisa, uma vez que o Vaticano nunca iria permitir a divulgação de documentos que confirmassem a ascensão de uma mulher ao trono de São Pedro.

A história original relata que tudo começou no final do Século IX, mas os mais renomados historiadores afirmam que Joana foi Papisa na época da confusão da Diocese de Roma; o ano não se sabe ao certo, porque todos os relatos fora da biblioteca do Vaticano foram queimados e ninguém tem acesso aos da Santa Sé, no entanto presume-se que tenha sido entre o ano 850 e 1100.

No livro A Papisa da romancista norte-americana Donna Woolfolk Cross, um dos livros mais vendidos sobre o assunto, a Papisa teria nascido em Constantinopla e fez-se passar por homem para fugir das perseguições impostas pela própria igreja em relação ao acesso á educação pelas mulheres; o romance descreve uma mulher extremamente culta com um elevado grau de entendimento em filosofia e teologia. Ela terá ido para Roma e ter-se-á apresentado como monge convencendo os restantes membros da igreja com a sua sabedoria. Com a morte de Leão IV assumiu o Trono de Pedro com o nome de Leão VII. Teria sido descoberta, quando acometida pelas dores do parto, deu há luz em plena procissão uma criança fruto de um caso com um dos guardas. A população terá reagido com sua indignação, apedrejando-a.

Há ainda quem defenda que o mito pode ter surgido em Constantinopla, devido ao ódio da Igreja Ortodoxa à Igreja Católica ou que, no século XIII, o papado tinha um grande número de inimigos, especialmente entre a Ordem dos Franciscanos ou a dos Dominicanos, que descontentes com as diversas restrições a que eram submetidas, teriam espalhado o boato. Em ambos os casos o objetivo seria desmoralizar a igreja através do boato que esta seria dirigida por uma mulher e desmoralizando-a devido à intensa misoginia característica da Igreja medieval.

Verdade ou mito, não podemos deixar de notar a preocupação da Igreja Católica em negar a existência desta mulher enquanto papisa. Uma das mais interessantes façanhas da vivência de Joana é um decreto publicado pela corte de Roma, proibindo que se colocasse Joana no catálogo dos papas, decreto que ainda hoje está em vigor.

A história em torno da Papisa Joana é um exemplo ilustrativo do papel das mulheres na Igreja Católica, e que atravessa séculos de misoginia e descriminação no acesso aos cargos da organização.

Mas o calvário das mulheres na igreja começa muito antes desta lenda. Começa quando as ordens eclesiásticas defenderam que a mulher era filha e herdeira de Eva, a fonte do pecado original e instrumento do Diabo, mostrando-a como inferior, e desprovida de inteligência, deixando-se enganar por uma serpente e enganando Adão, fazendo-o perder o paraíso, e seduzindo-o. Esta visão passou a fazer parte dos artigos teológicos da época, sem a mínima contestação, passando-se a ver na mulher um carácter maléfico e promíscuo, que precisava de ser disciplinado. Surge então a Lei canónica, que permitia que a mulher fosse agredida e espancada em qualquer classe social.

Foi proibido à mulher ocupar ou desempenhar cargos públicos e a Lei Secular determinava que as mulheres eram "frívolas por natureza, ardilosas, perspicazes, apegadas ao material (avarentas) e de pouquíssima ou quase nenhuma inteligência". A Lei eclesiástica de forma abrangente, mas não menos diminutiva, deixava claro o motivo, a razão e circunstância pelas quais as mulheres não podiam ocupar cargos públicos: "as mulheres não foram feitas para esse tipo de serviço, mais sim, para as ocupações femininas e domésticas".

Assim sendo o casamento era o destino, que acontecia com ou sem amor, acordados entre as famílias sem que elas tivessem uma palavra a dizer, apenas teriam obrigação de serem companheiras, fieis, amigas, excelentes donas de casa e mães.

O drama sofrido pelas mulheres prolongou-se até finais do séc. XVIII e início do séc. XX, quando de forma mínima, as mulheres passaram a reivindicar os seus direitos em busca da emancipação feminina. No entanto, a igreja permanece fechada á emancipação feminina e á alteração do papel das mulheres no seio da igreja.

Muitas vezes comparado a uma eleição politica, o conclave que terminou com a nomeação de Jorge Bergoglio tem uma diferença essencial em relação a outras eleições: a falta de participação de mulheres. Enquanto numa boa parte do mundo elas podem votar e ser votadas, na Igreja Católica o poder de decisão ainda é restrito aos homens. A demanda por mais participação das mulheres, e até mesmo a sua ordenação, é algo que tem crescido nos últimos anos entre os católicos. Até mesmo as freiras admitem que o papel das mulheres na Igreja ainda precisa crescer, mas o modo como e quando isso pode efectivamente acontecer ainda divide opiniões. Ainda no ano passado, um grupo de freiras, nos Estados Unidos, foi expulso da igreja por defenderam o acesso das mulheres aos cargos de poder desta organização. A igreja considerou o grupo como sendo de orientação feminista e decidiu desvinculá-las da igreja.

No Dia Mundial da Mulher, alguns padres presentes em Roma aproveitaram a ocasião para discutir o papel desta na Igreja. Desconhece-se até ao momento o resultado dessa discussão.

Aquando da eleição de Bento XVI falou-se na importância de colocar mais mulheres em posições de influência na cúria romana, mas foram feitos poucos progressos. Actualmente as mulheres apenas podem chegar ao cargo de subsecretário nas congregações do Vaticano, mas há apenas duas nessa posição.

Sabemos que existe a necessidade de mais participação das mulheres na Igreja, mas sabemos que isso não vai acontecer tão cedo. Porquê? "As mulheres são naturalmente ineptas para exercer cargos políticos; a ordem natural e as escrituras ensinam-nos que o homem é o ser politico por excelência; a mulher é sempre o apoio do homem e actuante, mas nada mais do que isso" – declarações do mais recente eleito Papa Jorge Bergoglio.

Vânia Martins

 

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