Em defesa da saúde, a oportunidade faz-se com todos Versão para impressão
Quarta, 30 Maio 2012

Curativo

Era um miúdo e levava a cabeça envolta numa ligadura amarelada. Tinha sido atropelado por uma motorizada. Na anca esquerda uma ferida aberta ainda por tratar obrigava-o a esboçar um esgar de dor de cada vez que dava um passo. Acabaram-se as compressas nas urgências - explicou - e o desinfectante também.

Entre as urgências e o portão do hospital, uma mulher com um bebé nos braços, vagueava incerta da direcção e da decisão a tomar. Parava e olhava em redor sem saber muito bem se continuava, se voltava para trás. A filha, com alguns dias de vida, não conseguia respirar bem mas o único aparelho de aerossol do hospital estava avariado.

As dores e a doença teimavam em acentuar-lhe as marcas da idade avançada. O autocarro já partira e agora teria de esperar pelo dia seguinte, para bem cedo percorrer uma hora e meia de distância por uma estrada esburacada e subir devagarinho, bem devagarinho, o morro onde com sorte, seria finalmente observada por um médico.

Com 57 anos, mãe de dois filhos que não lhe podiam valer, Paula tinha um tumor na hipófise. Não tinha dinheiro para os medicamentos e muito menos para o transporte até ao hospital, confessou. Queixava-se de fortes dores de cabeça e apresentava uma vista fechada. “Há dias que quase não vejo". Mas tinha vergonha de pedir fosse o que fosse..

Dois dos casos são situações vividas em África. Em São Tomé e Príncipe, onde tudo falta desde a Educação, aos Transportes, à Saúde. Faltam médicos, enfermeiros, medicamentos, utensílios, faltam meios de diagnóstico, faltam gases e compressas, desinfectantes e instrumentos cirúrgicos, faltam camas, recursos, falta tudo. Os outros dois casos tocam-nos de mais perto e têm alma lusitana. São situações vividas aqui dentro, em Portugal, por Portugueses. Todos estes casos partilham a marca da miséria, do desespero e da impotência dos que sofrem. Consegue distingui-los?

Já não se trata de um qualquer futuro sombrio e incerto. O futuro chegou. Sem acesso à saúde, sem médicos, sem medicamentos, sem transportes, sem justiça, sem dignidade, saúde agora é só para quem a pode pagar. É esta a marca da austeridade odiosa do PSD e CDS. É também esta a marca da austeridade «boazinha» do PS. É este o resultado das políticas daqueles para quem a saúde deve ser um privilégio e não um direito e para quem a saúde é, acima de tudo, uma excelente oportunidade de negócio.

O que podemos fazer? Podemos não ficar calados, podemos sair à rua, podemos juntar a nossa voz a outras e podemos, todos juntos, rejeitar este modelo que nos rouba a vida para a dar de bandeja ao sistema financeiro. Podemos sempre lutar. Esta é a nossa oportunidade.

Sandra Cunha

 

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