Governo mais troikista do que a troika Versão para impressão
Terça, 05 Julho 2011

alvaro_santos_pereira

Viseu exulta pela ida de três dos seus mais ilustres filhos para o novo governo da Nação. O simplesmente Álvaro, o repetente Cesário e o finalmente Henriques. Um ministro e dois secretários de Estado! O regozijo é geral e até as rochas de plúmbeo granito irradiam mais júbilo do que radão. Mas há sempre detractores para estragar a festa. O insuspeito comentador televisivo José Adelino Maltez  escreveu, a propósito: “Nada de novo nesta frente de direita, de contínua governança. (…) Para mim bastava uma fotografia dos grupos de interesses e dos grupos de pressão”. Sem mais.

 

Veja-se o novo Ministro da Saúde, Paulo Macedo, outrora administrador da Médis, empresa do grupo BCP que gere seguros de saúde, onde auferia 23 mil euros mensais antes de ser o cobrador de impostos de Manuela Ferreira Leite, a ganhar mais do que o Presidente da República. As privatizações vão chegar à gestão dos Centros de Saúde e de mais hospitais públicos. Os portugueses vão ter menos cuidados de saúde e pagar mais por eles.

 

Não só vamos ver aprofundar os ataques ao Estado Social, como as privatizações de empresas estratégicas do Estado. Os governos de Sócrates (campeão das privatizações em Portugal), abriram o caminho à direita, mas a partir de agora Passos Coelho terá as costas largas da Troika para prosseguir o desmantelamento dos serviços públicos.

 

Manuela Ferreira Leite afirmou que “o estado social é um mau exemplo que leva os portugueses a deixar de poupar para um imprevisto”. Já se sabe: a solidariedade social é má para os negócios. Porque a solidariedade é o antónimo do oportunismo. E toda a gente sabe que os tempos de crise estão prenhes de boas oportunidades. Basta ouvir Philippe Marini, relator geral da comissão de Finanças do Senado Francês, do partido de Sarkozy: “Enquanto a Grécia nos entrega um juro de 5% a operação é positiva, pois pedimos emprestado a 2%”.


O João Alexandre não foi para o Governo
João Alexandre Marques mora em Bodiosa, concelho de Viseu, mas não foi convidado para o governo. Não tem perfil: não percebe nada de Finanças, porque é pobre; nem de Saúde, porque é doente; nem de Educação, porque não perdeu muitos anos na escola. Trabalha desde os 13 ou 14 anos nas pedreiras. Tem silicose e três quartos dos pulmões inactivos. Por isso, mesmo que, por hipótese absurda, fosse convidado para o governo, nem que fosse para motorista do assessor do secretário de Estado do ministro, João Alexandre ver-se-ia forçado a recusar o lugar. Por falta de ar. Ele bem que gostaria de ter o peito de Passos Coelho, que se licenciou aos trinta e sete anos e até aos quarenta trabalhou na JSD e no PSD; depois dos 40 passou a trabalhar como administrador (ora administrador executivo, ora não executivo, ora administrador delegado, ora director financeiro, e até presidente ) de, pelo menos, sete sociedades anónimas  do seu mentor e correligionário Ângelo Correia, barão do PSD. É preciso muito peito para administrar e dirigir sete empresas quase em simultâneo.

 

João Marques só consegue trabalhar numa pedreira de cada vez. Recentemente, esteve três meses ligado ao oxigénio durante 16 horas por dia. Recebe 32 (trinta e dois!) euros por mês de pensão de riscos profissionais, e como é beneficiário da Segurança Social por Doença Profissional tem ainda direito a medicamentos gratuitos (vêem o mau exemplo do estado social?). João Alexandre Marques, não foi convidado para o governo, mas continua obrigado a governar a família. Aos 53 anos, com o quarto do pulmão que lhe resta, continua a trabalhar nas pedreiras.

 

Em 1.11.2007, denunciei, na imprensa local, um caso similar que dias depois apareceria na SIC: José Almeida Lopes, 54 anos, de Nesperido, Viseu,  apesar de estar ligado à bomba de oxigénio, 24 horas por dia, devido a uma apneia aguda provocada pela Silicose, depois de ter andado desde os 15 anos a trabalhar nas pedreiras, foi considerado “não incapaz para trabalhar” por um médico do Centro de Saúde (faltara a duas juntas médicas por estar internado no hospital de Viseu) que assim lhe negou a reforma antecipada, requerida após duas operações a ambos os pulmões no Hospital dos Covões.  Em 14 de Dezembro desse mesmo ano não foi preciso ir a nenhuma junta médica para a família comprovar que estava morto.

 

No Estados Unidos da América, um homem assaltou um banco e roubou um dólar. Precisava de fazer uma operação a uma hérnia discal e não tinha seguro de saúde como milhões de norte-americanos. Na sede do capitalismo, nada como seguir o lema do Capital: “no roubar é que está o ganho!”. Confiava que o sistema prisional o trataria no hospital da prisão. Parece que a pena a que foi condenado não foi suficientemente longa para lhe conceder esse luxo. Razão tinha Reagan: “Nos EUA só os burros é que são pobres.” Roubar um dólar...!

 

O que é que estes três homens têm em comum? Manuela Ferreira Leite certamente responderia: “Não foram poupados!” Pois, não, não os pouparam.

 

É por estas e por outras que eu acho que os portugueses, como os gregos, não devem poupar esta troikadura.

Carlos Vieira e Castro

 

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