Por uma política municipal intercultural Versão para impressão
Quarta, 18 Janeiro 2012

 

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O caso do bairro social de Viseu transformado numa 'zona de exclusão postal' e num 'guetto cigano'

O bairro social de Paradinha foi construído em 1995,  a escassos quilómetros da povoação que lhe deu o nome, `a entrada da cidade de Viseu, a contragosto da população que “desenterrou os machados de guerra” ao saber que iria conviver paredes meias com ciganos. Isto apesar daquele bairro também ter por objectivo realojar gente de outras etnias, negros e “caras pálidas”, na maioria retornados das ex-colonias, que viveram quase duas décadas no bairro da lata da Quinta da Pomba que so´ foi abaixo quando houve necessidade de por la´ passar a malha viária envolvente ao novo Hospital Distrital de Viseu.

No início deste mês de Janeiro, os CTT escreveram à Câmara Municipal de Viseu a informar de que deixariam de fazer a distribuição postal naquele bairro social, uma vez que a PSP deixara de disponibilizar agentes para escoltar os carteiros, medida de segurança praticada há cerca de dois anos, na sequência de 'diversas ameaças e tentativas de agressão' àqueles funcionários dos CTT.

Na perspectiva da cidadania não se pode tolerar que a agressão a carteiros (um caso de polícia que deve ser investigado, julgado e punido) sirva de pretexto para criar uma 'zona de exclusão postal' no Bairro Social de Paradinha, onde vivem cidadãos de diferentes etnias, 'pagando o justo pelo pecador' (os justos não se separam por etnias, nem os 'pecadores' têm sinais distintivos como os judeus estigmatizados pelos nazis ou pelos bispos portugueses dos Sécs. XV e XVI). Ambos são cidadãos e munícipes com direitos e deveres. Que o problema só tenha inquietado a Câmara Municipal de Viseu quando os CTT a informaram que a PSP deixara de disponibilizar agentes para acompanhar os carteiros, como se fosse normal que há cerca de dois anos moradores do bairro só recebessem o correio duas vezes por semana, é sintomático de uma politica que aceita a existência de 'guettos' no seu território.

Numa perspectiva sociológica há que encarar as particularidades culturais da etnia cigana de grande parte dos moradores daquele bairro social. Acontece que o município de Viseu desprezou o convite que o Alto Comissariado para a Imigração e o Diálogo Intercultural enviou para todas as autarquias, em Setembro de 2009,  para se candidatarem ao PROJECTO MEDIADORES MUNICIPAIS, um programa de formação de mediadores  interculturais,  para promover a comunicação entre ciganos e a comunidade envolvente e a prevenção e gestão de conflitos. Já se candidataram ao projecto 24 autarquias, tendo as 13 da primeira fase feito uma avaliação muito positiva da acção dos seus mediadores, ciganos e ciganas, jovens e menos jovens, que integrados em equipas interdisciplinares constroem canais de diálogo entre culturas, estimulando a participação da sua comunidade nos processos de decisão e desafiando a maioria a partilhar os recursos, negados a pretexto da resistência das minorias à integração /assimilação.

Os mediadores e as mediadoras culturais, ou os mediadores e mediadoras municipais interculturais de etnia cigana são formados para, através do diálogo entre a comunidade cigana e  a comunidade escolar, que devem sensibilizar para o conhecimento da história e cultura cigana,  promoverem o papel da escola na valorização individual dos ciganos e da auto-estima da sua comunidade, contrariando práticas,  que a 'tradição' não pode validar, de abandono escolar e de casamentos precoces e ilegais de menores de 16 anos, em ambos os casos muitas vezes por pressão dos pais ( com a consequente gravidez na adolescência), que comprometem o futuro das jovens ciganas, as quais, muitas vezes, sonham com uma “sina” diferente. Também devem fomentar a pré-escolarização e a promoção da formação profissional e do ensino recorrente (novas oportunidades), como alternativa à saída 'tradicional' como feirantes, profissão já saturada e em risco de extinção.

Há um défice de diálogo entre a Câmara Municipal de Viseu e a comunidade cigana de Paradinha que levou, há poucos anos atrás, à ocupação de apartamentos desocupados, por parte de jovens casais que se encontravam nas casas dos pais, sobrelotadas, depois de se terem cansados de esperar que a autarquia lhes arranjasse habitação social. A resposta da Câmara foi chamar a policia para os desalojar, não resolvendo o problema principal: a falta de condições dignas de habitação. Também há ciganos que acusam a autarquia de “limpeza étnica” no Bairro Social de Paradinha, ao transferir famílias de uns blocos para outros, de modo a ficarem blocos etnicamente puros, sem misturas. O mesmo se passa no Bairro da Balsa, onde há separação de etnias por blocos de apartamentos. Em contrapartida, no Bairro Social da Quinta da Pomba não mora uma única família cigana. O Bloco de Esquerda já levou levantou estes problemas e outros casos de discriminação de ciganos, através do seu deputado na Assembleia Municipal de Viseu.

O problema da (in)segurança de carteiros e funcionários dos SMAS no Bairro de  Paradinha não passa por acompanhamento policial, nem por apartados (que so’ protelam o “apartheid”), nem pela entrega do correio pela Caritas, como sugeriu o presidente da Junta de freguesia, mas pelo diálogo com os moradores, com o apoio de membros influentes da etnia (já não há propriamente patriarcas), enquanto não se recupera o tempo perdido (as candidaturas para a 2ª fase do Projecto do ACIDI acabaram em 9/06/2011) e se formam mediadores municipais interculturais.

Só o diálogo derrubará os muros que alguns responsáveis insistem em  altear.

Carlos Vieira e Castro

 

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