A esquerda não fica à espera do que acontece Versão para impressão
Terça, 27 Setembro 2011

 

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“As palavras estão gastas” – disse Seguro no congresso do PS. Pois estão. Mas conviria acabar de citar Eugénio de Andrade: “Já gastámos as palavras pela rua, meu amor/ e o que nos ficou não chega para afastar o frio de quatro paredes. (...) Gastámos o relógio e as pedras das esquinas/ em esperas inúteis”.
Esperar calmamente pelo fim da legislatura, como se propõe Seguro, é permitir as privatizações de serviços públicos, como os CTT e a Águas de Portugal, e a prossecução do desmantelamento do Estado Social; é assistir impávido aos cortes na Educação e na Saúde, com os portugueses exangues a caminho do calvário da recessão e da bancarrota; é pedir mais uma espera inútil a quem não ouviu uma única palavra que pusesse em causa o acordo que PS, PSD e CDS assinaram com a Troika, e que veio somar sacrifícios insuportáveis à já desmedida austeridade dos PECs que Sócrates impusera apoiado pela direita.
Como diz Eugénio num outro poema: “São como um cristal, as palavras./ Algumas um punhal,/ um incêndio./ Outras,/ orvalho apenas.”
Orvalho apenas é o que ressalta do silêncio húmido de Seguro sobre o que foi combinar com Passos Coelho. Um punhal nas costas de quem sofre a austeridade da troika externa e da troika interna de que o PS não descola?
É que a própria ONU no seu relatório sobre “Comércio e Desenvolvimento 2011” aconselha a que não se confie nas agências de “rating” para gerir as finanças púbicas, porque “a ideia de que o rigor orçamental reduz o défice e a dívida pública, restaurando assim a confiança dos mercados financeiros, vai resultar num efeito contrario ao pretendido ao afectar o crescimento do PIB e reduzir as receitas fiscais”. E a ONU aponta como alternativa à austeridade, politicas orçamentais que fomentem o crescimento e a reestruturação da dívida.
O silêncio sobre o punhal de Obama e da UE nas costas da Palestina ocupada e colonizada há 64 anos não é de esquerda. Votar contra a criminalização do enriquecimento ilícito, insistindo na “inconstitucionalidade do ónus da prova” não me parece de esquerda, por mais que Seguro se  esfalfe a explicar. Alinhar com o PSD na legalização de executivos autárquicos monocolores, não me parece de esquerda, nem muito democrático.
Um PS in-seguro na corda bamba, a oscilar entre as palavras e os actos, a tombar para a direita quando está no poder e a fazer proclamações de esquerda na oposição, já deu o que tinha a dar: a queda definitiva na terceira-via, aquela pastosidade corrupta e incompetente do bloco central que nos tem governado há quase 40 (quarenta!) anos.
António José Seguro foi durante 19 anos deputado do PS na Assembleia da República, integrou governos e foi deputado europeu. Ajudou a trilhar o caminho que levou a Sócrates e está acompanhado pela “tralha socrática”.

E já que começámos com poesia, deixem-me que vos diga que a Esquerda não fica como a nêspera do “Rifão quotidiano” do Mário Henrique Leiria, que “estava na cama/ deitada/ muito calada/ a ver/ o que acontecia/ chegou a velha e disse/ olha uma nêspera/ e zás comeu-a/ É o que acontece/ às nêsperas que ficam deitadas/ caladas/ à espera do que acontece”. 
Não sejas nêspera!  Chegou a hora da acção: a 1 e 15 de Outubro. Estão gastas as palavras.

Carlos Vieira e Castro

 

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