Os Femicídas e os seus Cúmplices Versão para impressão
Terça, 01 Março 2011

De acordo com o Observatório de Mulheres Assassinadas (OMA) neste último ano contam-se 43 vítimas mortais perfazendo um total nos últimos 7 anos de 250 femicídios. Estes números alarmantes exigem medidas políticas e sociais urgentes baseadas numa reflexão profunda sobre este fenómeno que atenta contra a humanidade e que anualmente põe termo à vida de várias dezenas de mulheres. A OMA denuncia um aumento de femicídios de 2009 para 2010 com 29 mortes contabilizadas em 2009 para as 43 anteriormente referidas no ano de 2010. Sem dúvida, um aumento sintomático de que as políticas tomadas não revelam efectividade ou não são devidamente cumpridas. Infelizmente, as denúncias levadas a cabo pelas vítimas junto dos organismos de segurança pública parecem não ser consideradas resultando inevitávelmente num crime cruel que poderia ser evitado. Também é relevante salientar que algumas das mulheres vítimas de femicídio já não se encontravam a residir com os agressores, o que implica que tenham sido vítimas também de perseguição e mesmo assim é comum responsabilizar a vítima pela sua morte e pelo desfecho trágico a que a sociedade e governo a condenam.

 

Não escutadas em vida, parece-nos que nem mesmo as suas mortes se tornam suficientemente gritantes para o nosso governo do Bloco Central. Não escutando estes gritos, o governo do Bloco Central torna-se anualmente cúmplice do femicídio e de um atentado contra os direitos humanos. Querem fazer-nos crer que a igualdade de género é hoje um dado adquirido mas estamos ainda longe disso pois estes números e a falta de medidas eficazes revelam-nos claramente que a morte de uma mulher continua a ser menos que a de um homem. O governo neo-liberal, que é tão conhecido pelo seu securitarismo, parece ter uma amnésia grave no que diz respeito a este assunto e à segurança destas vítimas.

O dia 8 de Março é um dia de celebração de todas as mulheres mas é também um dia que celebra o género humano ao inscrever, na História, a luta feminina pelos direitos humanos. Renegadas para um segundo plano pela História Patriarcal, as mulheres continuam hoje a lutar não só pelos direitos femininos, que lhes estão directamente implicados, mas também pelos direitos de todos aqueles que não se inscrevem na visão patriarcal da normatividade, da bipolaridade e da homogenia patriarca.

No dia 8 de Março de 1917 as mulheres russas manifestaram-se fortemente por melhores condições de vida, trabalho e contra a entrada da Rússia na Primeira Guerra Mundial exigindo “Pão e Paz”. Foram estas manifestações que registaram na História este dia que hoje designamos pelo Dia Internacional da Mulher. Esquecido durante muitas décadas pela maioria dos países, na década de 60 as activistas feministas reavivaram essa data simbólica mas foram necessários 17 anos para que as Nações Unidas a reconhecessem. Mesmo reconhecendo a data muitos governos neo-liberais procuram camuflá-la caractrizando-a como um dia no qual se oferecem presentes às mulheres parabenizando-as à semelhança de outros dias como o dia do pai, da mãe ou do dia dos namorados. Um dia portanto mercantilista e vazio de qualquer marco emancipatório.

Um dia meramente simbólico, é certo, mas um dia marcante políticamente que deve avivar na memória colectiva por um lado as conquistas sociais, políticas e económicas das mulheres e por outro a discriminação e a violência de que ainda são alvo definindo novas linhas interventivas e de activismo. Espera-nos ainda um longo caminho para que a igualdade de género seja alcançada. Para que isso se torne possível temos de erradicar a violência de género (e com ela o femicídio), conquistar os salários iguais, o direito ao trabalho e à independência económica, extinguir o assédio sexual, extreminar os despedimentos por motivo de gravidez conquistando uma discriminação positiva aquando da maternidade, adquirir a liberdade sexual, o direito à visibilidade histórica da mulher, à sua voz e à sua dignidade.

Urge um activismo social e político contra todas as formas de opressão e uma conquista da liberdade e igualdade de todo o género humano. Esse activismo deve ser já porque os direitos humanos são sempre para ontem.

Nádia Cantanhede