Grécia: "Na Europa, uma nova esperança internacionalista" Versão para impressão
Segunda, 19 Janeiro 2015

jovem syrizaContrariar o avanço das direitas radicais passa por Atenas.

 

Artigo de Cédric DurandRazmig Keucheyan e Stathis Kouvelakis

 

Com as eleições gregas previstas para o final de janeiro [25 de janeiro] e a possível ascensão ao poder do SYRIZA, o internacionalismo retorna à sua terra natal, a Europa. Durante a segunda metade do século XX, a solidariedade internacional da Esquerda manifesta-se principalmente países extra-europeus: Argélia, Cuba, Vietname e Nicarágua. Entretanto, as experiências revolucionárias multiplicaram-se no Terceiro Mundo, atraindo o apoio de redes de militantes do Velho Continente, órfãs de revolução em casa. Daí a importância do "Terceiro Mundo" no imaginário político de 68. A distância geográfica dá a este internacionalismo, por vezes, um caráter abstrato, mesmo quando ele é um heroísmo admirável como experiência formativa para uma geração de ativistas, os "porteurs de valises" da Frente de Libertação Nacional argelina.

Devido à sua localização na periferia do capitalismo, os regimes apoiados eram muitas vezes pobres e frágeis. O subdesenvolvimento, do qual tentavam sair com base no voluntarismo político, fez com que esses modelos não fossem facilmente reproduzíveis no coração do sistema.

As eleições gregas iminentes [25 de janeiro] representam uma mudança radical na situação. Porque agora a solidariedade internacional poderá dirigir-se a um país europeu. O mais débil dos países da Europa [dos 27], é claro, mas um país europeu em qualquer caso. A geografia importa na política. Permite que pessoas, recursos e informações fluam facilmente. Depois de um longo eclipse histórico, as condições para um internacionalismo concreto voltar a convergir na Europa. Uma verdadeira mudança de época.

As classes dominantes europeias não se enganam. De Pierre Moscovici a Wolfgang Schäuble, passando por  Jean-Claude Juncker, não passam um dia sem pedir para acabarem com o Syriza. O FMI, por sua vez, afirma que as negociações sobre a concessão de uma linha de crédito de 10 mil milhões de dólares vai ser retomada "quando o novo governo tomar posse na Grécia". Não há forma mais indigna de interferir num processo democrático.

Estas declarações mostram que o único internacionalismo operativo hoje é o internacionalismo do capital. Ao contrário dos oprimidos, os opressores são coordenados para além das fronteiras nacionais. No Velho Continente, a sua internacional tem um nome: "União Europeia", entidade que desde os anos 80, não parou de trabalhar um dia que fosse, em favor dos interesses do capital, mesmo ignorando a soberania popular.

A chegada do SYRIZA ao poder tornará finalmente concebível o internacionalismo contra o capital, um internacionalismo da classe trabalhadora. Primeiro passo: a organização imediata de redes de apoio da esquerda radical grega em todo o continente. Precisará delas, pois a pressão da União Europeia e dos "mercados financeiros", inevitavelmente, intensificará nas próximas semanas. A Bolsa de Atenas entra em colapso e as taxas de juros sobre a dívida grega disparam. No dia seguinte à eleição, como aconteceu no passado com Chipre e Irlanda, o Banco Central Europeu vai dar ao governo um ultimato ordenando ao Governo do Syriza para se submeter às políticas neoliberais da Troika, ou então rejeitar títulos de dívida grega como garantia, e fechar a torneira da liquidez de emergência, cortando de facto o financiamento do país. Neste braço de ferro, as reivindicações das massas ressoam além dos Peloponeso: o cancelamento da dívida! Nenhum sacrifício para o euro!

O impacto da subida ao poder do SYRIZA será sentido mesmo no debate francês. O sucesso da Frente Nacional e dos seus intelectuais orgânicos, tais como Eric Zemmour alimenta-se da ausência de alternativas às políticas neoliberais, à pobreza e ao racismo que eles radicalizam. Se uma alternativa aparece, o equilíbrio de poder vai mudar imediatamente em todos os países do continente. Contrariar o avanço das direitas radicais passa por Atenas.

O filósofo grego Nicos Poulantzas, que se estabeleceu na França - um dos instigadores da estratégia política da Syriza - apelava nos anos 70 para a experimentação de ums "via democrática para o socialismo". Quase meio século depois, a possibilidade de uma tal via é aberta novamente na Europa. Se o povo grego fizer a primeira ruptura com o neoliberalismo, e tiver a audácia de iniciar um processo de transformação social radical, os outros povos da Europa terão uma oportunidade histórica de fazer da causa grega a sua causa.

Cédric DurandRazmig Keucheyan são professores de sociologia na Universidade de Paris-IV e Stathis Kouvelakis é professor de filosofia King College de Londres

 

Traduzido por Bruno Góis para A Comuna. "En Europe, un nouvel espoir internationaliste» publicado originalmente no Liberation e traduzido para Espanhol no Sin Permiso por Gustavo Buster.