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Terça, 05 Julho 2011

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Enquanto em Portugal vivíamos o rescaldo das eleições de 5 de Junho, com os partidos e as forças sociais a fazerem análise e a emitir as suas posições quanto ao resultado das mesmas, as medidas de austeridade iam fazendo estragos por essa Europa fora, e enfrentando, ao mesmo tempo, as lutas sociais e laborais de cada um dos povos.

 

Para nós, que queremos resistir, lutar e vencer as medidas de austeridade que as “troikas” nos querem impor foram muito importantes algumas mobilizações no mÊs de Junho. Foi muito importante que os cidadãos europeus em Itália, Espanha, França, Luxemburgo, Grécia e Reino Unido tenham desenvolvido, por diversas formas e em tempos diferentes, lutas em defesa dos seus direitos contra os pacotes de austeridade, em defesa dos serviços públicos e duma democracia participativa que tenha em conta a vontade popular.

 

- Itália, 12/13 Junho: quatro referendos - pela água pública; contra o aumento dos preços das tarifas; pela rejeição da energia nuclear; pela rejeição da imunidade de Berlusconi. Vitória total dos cidadãos;

 

- Espanha/ França, 19 Junho: manifestações com milhares de pessoas nas ruas e praças de Madrid, Barcelona, Valência e Paris por “Democracia Verdadeira Já” e contra o Pacto do Euro, tendo os 150.000 concentrados em Madrid apelado à Greve Geral;

 

- Luxemburgo, 21 de Junho: manifestação sindical europeia convocada pela CES;

 

- Grécia, 28/29 Junho: greve geral contra a imposição de um novo pacote de medidas com mais privatizações, cortes salariais e aumento de impostos que o governo 'socialista' do PASOK e a maioria que o suporta no parlamento (que foi cercado pelos cidadãos) aprovou contra a vontade do povo, seguindo à risca o que o FMI e a “Kaiser” Merkel lhes ditam;

 

- Reino Unido, 30 Junho: greves dos trabalhadores da Função Pública e de alguns sectores do privado, com manifestações em diversas cidades. A de Londres juntou 30.000 pessoas. Ed Miliband, líder do Partido Trabalhista considera as greves “erradas”, vejam só!

 

De referir ainda que o Conselho Europeu decorreu no dia 23 de Junho e como é habitual as suas conclusões vão no sentido de favorecer os mercados e fazer novas exigências aos cidadãos. Relativamente ao governo português, foi realçado o “forte compromisso” que demonstra na aplicação cega das medidas da Troika.

 

Podemos concluir que os governos nacionais estão de joelhos perante os que verdadeiramente mandam, mas não deixam de apertar o cinto ao povo. Esta é a atitude que também o governo PSD/CDS assume em Portugal.

 

Não se conseguem descobrir as diferenças entre os partidos “socialistas” os “sociais-democratas” ou “centristas”, são todos iguais, porquanto são meros executores coloniais das políticas do FMI/EU/BCE.

 

Esta realidade impõe que, à esquerda, sejamos capazes de juntar forças para abrir um novo ciclo de mobilização popular que pode ser prolongado no tempo e que carecerá duma coordenação maior e mais eficaz entre os vários movimentos sociais, o movimento sindical e os partidos políticos, que permita responder a esta ofensiva desenfreada do capital à escala nacional e europeia.

 

Somos hoje confrontados em Portugal com os principais órgãos do Estado nas mãos da direita, com tudo o que isso implica no imaginário das pessoas e das dificuldades que acarreta para as lutas.

 

A campanha mediática dos sacrifícios e das inevitabilidades está para ficar.

 

Assistimos agora a uma nova vaga de encerramentos de empresas e despedimentos colectivos que coloca uma enorme pressão sobre os trabalhadores e os sindicatos e cria um clima de medo e resignação a que é preciso dar combate.

 

Transformar isto implica criar confiança e demonstrar nas pequenas e grandes lutas, ouvindo os trabalhadores, de que é possível de forma gradual e em crescendo alterar a actual correlação de forças.

 

O Programa de Governo que Passos Coelho apresentou na Assembleia da Republica está prenhe de todos os ingredientes para atacar o valor do trabalho e penalizar os mais pobres deixando intocáveis os rendimentos do capital.

 

O esbulho de 50 % do subsídio de natal a mais de 3 milhões de portugueses é provavelmente a melhor prova para confirmar a nossa razão e rejeição a este programa de governo. Passos Coelho dizia a 1 de abril de 2011 que pensar num corte do subsídio de natal era "um disparate", mas introduziu-o agora como medida extraordinária.

 

Façamos um breve exercício de memória sobre as promessas e afirmações de Sócrates e Passos Coelho relativamente a impostos (IVA) e subsídio de natal, respectivamente. Não descobrimos diferenças, ambos mentiram, qualquer deles tinha e tem uma agenda oculta para governar.

 

O Ministro da Economia e do Emprego, Álvaro Santos Pereira, afirma que a sua 1ª prioridade é a Concertação Social e não é ingénuo na sua vontade, porque a verdade é que para os trabalhadores daí nada de bom lhes chega, diz-nos a experiência.

 

Uma maior flexibilização das relações laborais, a redução da TSU (taxa social única) na parte a ser entregue pelos patrões à Segurança Social; o embaratecimento e uma maior facilidade nos despedimentos, acompanhado duma desvalorização do subsídio de desemprego; a continuação do ataque à contratação colectiva; as medidas desreguladoras no que diz respeito ao trabalho temporário e aos contratos a termo com a criação do “Contrato Único” que só servem para aumentar a precariedade laboral, são a matriz do programa do governo para a área do trabalho.

 

Ou seja, o agravamento da exploração com transferências brutais dos rendimentos do trabalho para o capital. Pergunta-se então, para que servirá a Concertação Social?

 

O senhor ministro não esperará certamente que uma verdadeira organização representativa de trabalhadores aceite que, no domínio da duração do trabalho e especialmente no estabelecimento de horários de trabalho, o Banco de Horas seja introduzido por acordo individual ou grupal, sem necessidade de previsão em IRCT. Ou o Trabalho Suplementar – para alinhar com práticas internacionais de países de referência - seja compensado por concessão de tempo equivalente de descanso ou férias ou por remuneração suplementar.

 

A ser assim, isto representaria a destruição dos contractos colectivos de trabalho, pois com estas duas questões resolvidas para que é que os patrões precisam de negociar o que quer que seja e muito menos aumentos salariais que é outra das matérias fundamentais da negociação colectiva.

 

No fundo, o programa de governo e a ideologia que o alimenta, mais não significam que um ataque feroz à base económica da democracia e ao Estado Social, particularmente ao Serviço Nacional de Saúde, à Escola Pública e à Segurança Social.

 

Importa saber que respostas vamos dar perante cada uma das medidas concretas que ataquem a vida quotidiana das pessoas. Esta é uma responsabilidade que não enjeitamos e para a qual devemos estar mobilizados e preparados. No meu entender, as propostas apresentadas durante a campanha eleitoral pelo Bloco de Esquerda, significam que estamos.

 

A proposta de uma auditoria e renegociação da dívida está hoje na ordem do dia e a ser discutida por pessoas e organizações; quero destacar o Seminário promovido pelo CES em 30 de Junho onde participou entre outros, Éric Toussant e o apelo a uma iniciativa unitária sobre esta matéria saída do Seminário Internacional sobre Sindicalismo realizado a 18 de Junho. A necessidade de uma “auditoria cidadã à divida pública” reveste-se da maior centralidade. Encontre-se uma plataforma que a leve à prática de modo transparente e participado.

 

Os movimentos sociais ligados à precariedade têm de ganhar mais espaço, representatividade e intervenção junto daqueles que sofrem na pele os seus efeitos, mas também trabalharem junto dos sindicatos, procurando respostas que permitam acção comum em torno de questões concretas.

 

O movimento sindical, particularmente a CGTP como principal força social capaz de mobilizar largas massas nas ruas, tem de encontrar novas agendas, estratégias e práticas que a mantenha uma força aglutinadora, para influenciar positivamente os acontecimentos. Mais democracia interna e discussão envolvendo a base cria mais autonomia e independência na sua relação com os partidos políticos. Nesta perspectiva, o próximo congresso a realizar em Janeiro de 2012 é muito importante.

 

Ajudar a arrancar com a luta social onde quer que ela se desenvolva é uma das nossas principais responsabilidades pelo que se impõe que estejamos, sem controleirismos, onde estão os problemas sociais ou laborais, contribuindo de modo empenhado para a sua resolução através da mobilização popular e cidadã.

 

No Parlamento e nas Ruas, somos nós que temos de fazer as diferenças.

Francisco Alves

dirigente sindical